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18 de agosto de 2011

Orla de Belém: patrimônio de uso comum do povo

Nos últimos meses, acompanhamos nos meios de comunicação a denuncia de um agressivo movimento de privatização da orla de Belém, em especial da orla da baia do Guajará, pelo capital especulativo imobiliário.

A surpresa de todos foi grande porque há muito esses espaços estavam protegidos pela lei orgânica do município e pelo plano diretor de 1993, resguardados como de uso comum do povo e, portanto, destinados à revitalização urbana e recuperação ambiental. Muito embora a ocupação da orla tenha ocorrido de forma desordenada, o plano diretor buscou corrigir esta situação e devolver a orla ao povo de Belém. Mas por que então essa nova investida sobre a orla de Belém?

Nossa cidade tem passado por mudanças significativas na forma de uso e ocupação de seu solo. Suntuosos edifícios brotam como num passe de mágica em cada esquina, num movimento frenético de verticalização de nosso espaço urbano. A novidade é que agora esse movimento está em perfeita articulação com o processo de globalização financeira. O que assistimos hoje em nossa cidade é a formação de grupos empresariais numa estreita relação entre interesses econômicos locais, nacionais e globais. Nosso território entrou na alça de mira de poderosas corporações, que foram capazes de estabelecer alianças políticas nacionais e locais para mudar a legislação urbanística municipal e influenciar de forma decisiva na liberação, com a aprovação do poder público, de áreas privilegiadas de nossa cidade para o processo de especulação imobiliária. O capital agora não se contenta com bons terrenos, busca se apropriar das amenidades proporcionadas por nossos recursos naturais. Em suas propagandas, triunfalmente comercializam a nossa vista para a baia, a nossa brisa e tudo que possa sugerir qualidade de vida ao comprador.

Assim, o setor conseguiu promover, na revisão do plano diretor, expressivas mudanças no texto legal com o intuito de remover todos os obstáculos à conversão desses espaços em mercadorias e sua incorporação ao processo de circulação e acumulação do capital, mesmo que em detrimento do equilíbrio ambiental e dos interesses coletivos de nossa população.

Pesquisadores da faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Pará concluíram que, em algumas zonas da cidade, os índices de aproveitamento previstos no atual plano diretor aumentaram escandalosamente, comparativamente ao Plano Diretor de 1993. No caso da construção de edifícios na Zona do Ambiente Urbano 5 (zona que inclui a orla da baia do guajará), este índice aumentou em mais de 100%. Caso a sociedade permita que tais índices sejam aplicados, terá que conviver com os problemas socioambientais do conseqüente adensamento construtivo na área, provocados pela verticalização pouco criteriosa desses espaços, além de sua exclusão do direito de uso e contemplação da orla.

Digo pouco criteriosa, porque a emissão de licenças de construção por parte da prefeitura tem se dado de forma cartorial sem resguardar os parâmetros técnicos mínimos necessários a uma boa decisão sobre o desenvolvimento de nossa cidade. Será que os pretensos benefícios proporcionados por esses empreendimentos compensam seus impactos socioambientais? Os empreendimentos estão de acordo com o que diz a legislação urbanística e ambiental?

Fico ainda mais espantado que, em época de aquecimento global, quando organismos internacionais alertam para a elevação do nível dos oceanos, recomendando que construções em áreas costeiras a menos de um metro do nível da maré alta sejam interrompidas para evitar as conseqüências dessas alterações ambientais, a prefeitura de Belém, na contra mão da história, continue autorizando tais construções, como se Belém não fizesse parte desse planeta.

Graça a Deus que a reação da sociedade se fez. Ambientalistas, num ato de ousadia, acorrentaram-se aos portões do canteiro de obras do edifício Premium, denunciando a irregularidade da construção que não possuía o devido licenciamento ambiental. Com o apoio da OAB Pará, levaram a denuncia ao Ministério Público Estadual que, em conjunto com o Ministério Público Federal e a Advocacia Geral da União, ajuizou uma ação civil pública pedindo o embargo dos edifícios Mirage Bay e Premium.

A ação culminou com a decisão do Juiz Hugo Sinvaldo Silva da Gama Filho, da 9ª Vara da Justiça Federal de Belém, impedindo a prefeitura de Belém de emitir novas licenças para a construção de edifícios na orla do município sem a realização de estudos de impactos ambientais e de vizinhança, além de determinar a suspensão de todas as obras já em execução.

De certo foi uma grande vitória que colocou termos nessa disputa entre Davi e Golias. Mas o poder econômico envolvido nessa luta é gigante e certamente recorrerá. A guerra está vencida? Infelizmente, creio que ainda não! Mas confio que no final o bom censo prevalecerá e com a tenaz resistência do pequeno Davi de Belém o gigante vai cair!

6 comentários:

  1. Evandro, tu és o máximo!!!1
    Admiro muito você.
    O mundo precisa muito de pessoas como você para lutar pela causa ambiental!

    Maisa Social

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  2. Apesar da leitura rebuscada, o que constitui um obstáculo para meus dois neurônios, consegui compreender e concordo em gênero, número e grau.
    Vc é um super Papaxibé verde!!
    Adoro vc!

    Franciney dos Anjos

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  3. Cada vez a blogosfera cresce em número e qualidade.

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  4. Seja bem vindo e tenho a convicção que quem ganha com sua presença e seus comentários, que refletem uma justa posição política, são todos que lutam por uma sociedade mais justa, humana e solidária.

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  5. Belíssimo texto! Parabéns pela veia jornalística! Fomos colegas de trabalho na Semma de Belém em 2009 e desde lá acompanho sua carreira. Te desejo sucesso na nova empreitada! Deus te abençoe e proteja. Abraços!

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  6. Obrigado a todos pelo apoio. Espero que o blog contribua com o debate sobre sustentabilidade em nosso Estado.

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